Por alguns pontos de vista, o “cutting” ou a automutilação,
como conhecemos, vem sendo tratada como: frescura, um modo de chamar atenção ou
muitas vezes por pura loucura. Quando na verdade, a maioria das pessoas que
praticam esse ato, o fazem como um silencioso pedido de socorro. A
automutilação pode ser considerada como um tipo de mascara, que serve para
amenizar a dor ou o sofrimento mental, e transformá-los em dor física para que
assim se possa esquecê-los por determinado período de tempo.
Em uma entrevista com o psicólogo Darlindo Ferreira De Lima.
Podemos entender um pouco mais sobre essa prática, que muitas vezes pode levar
a uma dependência para se enfrentar o dia-a-dia
Qual sua opinião sobre a automutilação?
R= Veja só, a automutilação é um sintoma, a gente não pode
confundir o sintoma com a causa. O que é o sintoma? É aquilo que é aparente, é aquilo que a gente
consegue perceber a respeito de algum processo. Por exemplo, a febre, é um
sintoma de que algo está errado no corpo, muito provavelmente uma infecção, ou
coisa do gênero. Então a automutilação é um sintoma, de processos que estão
ocorrendo nessa pessoa, que precisam ser melhor investigados. Existem vários
tipos de automutilação, e existem várias intensidades. Uma das mais conhecidas,
que eu não recordo o nome agora, é a automutilação em relação ao cabelo. Em que
as pessoas ficam tirando os cabelos, e muitos não só tiram como ficam
mastigando e engolindo-os, tem um nomezinho que se dá a isso, mas não estou
lembrando agora. Bem, eu acho que tem que ser feita uma investigação, talvez um
diagnóstico, fazer uma contextualização da vida dessa pessoa, fazer um
levantamento do contexto atual da vida dela, pra tentar entender quais os
elementos, quais as questões conscientes e inconscientes, que estão
contribuindo para que este sintoma apareça, mas a automutilação é uma coisa
séria que precisa ter cuidado e que pode provocar danos sérios para esse
indivíduo.
Como as escolas podem ajudar a combater essa prática? O que
tanto os alunos quanto os professores a direção podem fazer para ajudar?
R= Acho que a primeira coisa é conversar. O aluno tem que está
aberto pra reconhecer que isso é um problema, precisa conversar com os pais,
com alguém que possa ajudar. Os professores por sua vez têm que estar abertos
para identificar o problema e conversar com a família, e quem sabe procurar uma
ajuda especializada. Geralmente na Gerência Regional de Ensino ou na própria
escola há acompanhamento psicopedagógico. Seja um pedagogo ou um psicólogo que
entenda dessa questão, que busque um auxílio ou enviem a pessoa para procurar
um acompanhamento. Em minha opinião não existe segredo, basta conversar e
dialogar, reconhecer que há problemas, reconhecer que há uma limitação e que se
precisa fazer alguma coisa. Isso de ter medo, ter preconceito, não querer
falar...É feito uma bola de neve só vai volumar o problema.A pessoa que tem
esse tipo de sintoma ela precisa de cuidado.
Em um segundo momento, fazer um trabalho preventivo de
esclarecimento junto aos alunos. Por exemplo, um professor de biologia ou um
pedagogo, podem fazer oficina onde levem esse tema como forma de
esclarecimento. Primeiro o grupo do qual precisa ser cuidado, e depois vai
trabalhando e apresentando para os demais grupos.
Como se pode identificar se alguém próximo sofre algum tipo de
transtorno, não só o da automutilação, mas qualquer outro transtorno
psicológico?
R= Depende muito do transtorno, depende muito da idade, depende
muito do contexto.
A automutilação é visível, ou a pessoa está se cortando, ou
a pessoa está tirando o cabelo, ou a pessoa... Enfim é aparentemente,percebe-se
que tem alguma coisa errada. Então as pessoas que estão próximas, precisam
estar atentas, eu acho que um grande problema da educação, é empurrá-la para o
outro.Os pais empurram a educação pra escola, a escola por sua vez empurra a
educação para o professor, o professor empurra para a escola, a escola empurra
para o pedagogo, pedagogo devolve para o professor... Enfim, fica nessa. Todos
têm uma responsabilidade. A responsabilidade não é só da escola, nem é só do
professor e nem tão pouco é apenas da família. Todos esses atores sociais que
estão envolvidos eles precisam conversar,eles precisam dialogar, e
principalmente o aluno, o aluno é o maior interessado, o aluno é o que mais vai
ganhar ou quem mais vai perder com essa história. Então não acho que tem
receita de bolo, cada caso é um caso, cada sintoma é um sintoma. E a partir daí
você vai conversando, e procurando uma solução para essas situações.
Qual a sua opinião, quem se automutila é uma forma de chamar atenção
ou é realmente uma válvula de escape?
R= Eu não sei, não da para julgar não dá para falar generalizadamente.
Cada caso é um caso. O sintoma, volto a dizer ele é a expressão de algo que
está ocorrendo, é como se fosse uma linguagem, que a gente não consegue
identificar,de uma língua que precisa ser falada. Então nós temos que criar
mecanismos para que o que está se expressando como sintoma de forma
lingüística. Ou seja, a pessoa atribui nomes ou frases: “Eu estou triste”,
“Estou angustiado”, entre outros. Mas não dá pra fazer, seria muito artificial
esse tipo de leitura.
O que eu poderia fazer para dar continuidade ao projeto D.N.A?
R= Assim, eu acho que a sua intenção ela é muito boa, já de
início, porque, só em falar sobre isso, só em problematizar sobre isso, você já
vai fazer uma contribuição enorme para os alunos para a escola, para os pais...
Etc. mas você tem que deixar claro para você o que realmente você quer, porque
são grupos diferentes, com objetivos diferentes, com demandas diferentes.
As meninas e os meninos que estão fazendo isso estão
precisando de cuidado. O grupo que não está fazendo e de repente está
praticando bullying, está conhecendo essa situação, isso requer outra
abordagem, que seria o esclarecimento.
Primeiro criar espaços para se discutir, que de uma maneira
você já tem feito, é criar espaços para essa pessoa ser escutada, dentro da
escola seria interessante, segundo, incentivar a escola a fazer um
acompanhamento mais sistemático, da relação professor aluno, escola família,
isso seria uma coisa interessante.
O que você pode fazer é criar essa discussão, é criar esse
debate, criar mecanismos para que essas pessoas não se sintam tão sozinhas,
dessas pessoas terem um lugar pra conversar. Vê se na tua cidade deve ter CRAS
(Centro de Referência em Assistência Social), falar com as escolas pra fazer
contato com os CRAS e as CREAS (Centro de Referência Especializada em
Assistência Social), falar com a tua escola fazer contato com os NAFES... Ter
algum trabalho para os adolescentes... Enfim, isso é um trabalho bacana.